Um estudo feito pelo Banco Mundial revelou que o Brasil está desperdiçando talentos infantis. De acordo com a pesquisa, divulgada em julho deste ano e intitulada Relatório de Capital Humano Brasileiro: investindo nas pessoas, uma criança brasileira nascida em 2019 deve completar 18 anos alcançando apenas 60% do seu capital humano potencial, que reúne as habilidades acumuladas ao longo da vida. Ou seja, em média, 40% de todo o talento do país é ignorado.
A pesquisa é parte do Human Capital Project, projeto lançado em 2018 pela instituição como forma de conscientizar o governo sobre a importância de estimular talentos e dar assistência a todas as faixas etárias, sem distinção de classe social.
A instituição diz que o PIB (Produto Interno Bruto) do Brasil poderia ser 2,5 vezes maior, com porcentagem de 158%, se as crianças brasileiras tivessem incentivo na formação de habilidades. Ela estima ainda que, entre os mais vulneráveis, o desperdício de talentos era de 55% antes da pandemia, o que mostra crescimento da situação no cenário pandêmico. Razões como a crise sanitária, economia e foco em outros assuntos contribuíram com o processo.
“Estamos vendo como uma crise que se arrasta. O Brasil é um país importante no globo, que estava em desenvolvimento avançado e retroagiu muito”, resumiu o historiador Thiago Modenesi, professor do Centro Universitário Tiradentes (Unit Pernambuco).
ICH
O Banco desenvolveu o ICH (Índice de Capital Humano), que tem dados de educação e saúde, e monta uma previsão de produtividade das próximas gerações de pessoas com emprego. O gráfico vai de 0 a 1, avaliando taxas de mortalidade e déficit de crescimento, anos de escolaridade e taxa de sobrevivência dos adultos. O 1 representa total aproveitamento de trabalhos, boa saúde e estímulos.
No Brasil, o panorama do futuro é preocupante: a instituição definiu o ICH do país como 0,60, ficando abaixo de vários países desenvolvidos, como Estados Unidos e Japão - seria preciso 60 anos para alcançar o ICH deles. As regiões do Brasil também sofrem desigualdade, com cada uma tendo seu índice de desenvolvimento. “Mesmo antes da pandemia, a região Norte/Nordeste tinha um delay de 12 anos de capital humano em relação ao resto do país. A pandemia piorou a situação”, contou o professor.
Ainda de acordo com o Banco Mundial, também existem disparidades entre cor e gênero. A produtividade de uma criança branca em 2019 era de 63%, comparado a 56% para uma criança negra, e 52% para indígena. Em relação às mulheres, elas tiveram o ICH de 60% no mesmo ano, em comparação a 53% dos homens, mas no mercado de trabalho a situação é contrária: elas ficaram com 32%, enquanto eles com 40%. “O Brasil tem bastante descompasso entre raça e gênero. Os negros têm um índice menos aproveitado, e as mulheres têm aproveitamento de capital, mas não dos postos de trabalho, com preconceito de mercado”, pontuou o historiador.
O dado chama a atenção para a falta de diversos apoios ao desenvolvimento intelectual e profissional das pessoas, como incentivos e mais políticas públicas. Especialistas defendem que mudanças ainda primárias, na escola, podem ajudar a resolver a problemática. “Esse desafio passa por um maior investimento na educação, valorização de profissionais da área, como o professor, rediscutir conteúdo e ajudar na inserção desses estudantes na sociedade”, salienta Modenesi.