Embora os casos confirmados de febre amarela tenham diminuído no Brasil nas últimas três semanas, segundo boletins do Ministério da Saúde, o vírus continua se expandindo pelo país, de acordo com especialistas.
A entomologista Maria Anice Sallum, professora do Departamento de Epidemiologia da USP, afirma que o vírus está se dispersando por regiões onde não ocorria anteriormente, caminhando pelo litoral em direção à região Sul. “O brasileiro terá que conviver com a doença, assim como faz com a dengue”, explica.
Segundo Renato Kfouri, vice-presidente da Sociedade Brasileira de Imunizações (SBIm), o vírus persiste circulando nas matas em regiões onde não circulava. “A epidemia está em decréscimo, como era de se esperar, por causa da sazonalidade da doença. Tende a desaparecer casos em humanos, mas o vírus continua circulando”.
O vírus circula no Norte e Centro-Oeste o ano todo, consideradas regiões endêmicas da doença. Ele explica que a novidade foi sua litoralização, a migração o vírus para o litoral, até então, zona livre de febre amarela. “Vamos ter que conviver com a febre amarela em regiões de mata na região Sudeste como já convivemos nas regiões Norte e Centro-Oeste”.
O Ministério da Saúde afirmou, por meio de nota, que o número de casos confirmados de febre amarela tem diminuído, embora casos suspeitos ainda estejam sendo notificados pelos Estados e municípios.
Atualmente, há mais de mil casos da doença em investigação espalhados por 23 Estados brasileiros, segundo o Ministério da Saúde. Apenas três do total, não apresentam nenhuma suspeita da doença: Acre, Roraima e Sergipe.
“A febre amarela no Brasil apresenta um padrão sazonal bem definido para a ocorrência de casos humanos, com maior registro de casos nos meses de dezembro a maio. Mas, ainda que os casos tendam a reduzir após esse período, é preciso manter a intensificação da vacinação nas áreas afetadas, bem como ampliar a adesão da população, já preparando as áreas adjacentes para a vacinação preventiva antes do próximo verão”, diz a nota.
Aquecimento é a causa da epidemia
O aquecimento climático é a principal causa da epidemia de febre amarela no Brasil, de acordo com o pesquisador Adriano Pinter, da superintendência do Controle de Endemias (Sucen). “Antes, o frio era uma barreira, mas invernos mais quentes nos últimos anos contribuíram para a chegada do vírus ao Sudeste. O desmatamento da Amazônia acelerou a migração do vírus para a região, mas a causa da epidemia está relacionada ao aquecimento”, explica.
A temperatura continua muito favorável à manutenção da epidemia da febre amarela. “Seria necessário ao menos 13ºC para conter seu avanço, e não é isso que estamos observando”, afirma Maria Anice.
Ela ainda aponta a globalização e a urbanização como fatores que contribuíram para a mudança do cenário da febre amarela no Brasil. “O desmatamento provocado pela urbanização coloca a população humana e animal vivendo em contato com mosquitos silvestres. A fragmentação da floresta facilita muito a transmissão”, diz.
“No Brasil, há muitas espécies de mosquito e em grande quantidade. Caso outros vetores desenvolvam a capacidade de transmitir a febre amarela o quadro vai ficar complicado”, completa.
Histórico da epidemia
Segundo o Ministério da Saúde, a epidemia teve início em 2014 na região Norte, com expansão no sentido Leste-Sul do país, afetando a região Centro-Oeste entre 2015 e 2016.
Já em 2016 alcançou a Sudeste, a mais afetada pelo vírus da febre amarela nos últimos dois anos, ainda de acordo com o ministério. “O vírus atingiu um grande contingente populacional em áreas que não eram cobertas pela vacina”, explica a entomologista.
“A transmissão do vírus se deslocou do interior de São Paulo e de Minas Gerais, dispersando-se no sentido Leste, onde afetou diversas áreas do bioma Mata Atlântica, avançando no sentido Norte-Sul ao longo de uma grande faixa Leste do Brasil”, diz a nota.
O ministério informa que a vigilância de casos em macacos e em humanos tem indicado as novas áreas de expansão.
“Mesmo com a redução dos registros de casos humanos nas últimas semanas, em virtude do período atual, mantém-se a estratégia de prevenção, enfatizando a importância da vacinação seletiva, onde o vírus já foi registrado, a em áreas ampliadas”, diz a nota do ministério.
Todo o território brasileiro é considerado área de recomendação da vacina. A vacinação será realizada de forma gradual, com previsão de ser concluída até abril de 2019.