O vírus transportado pelo mosquito que causa a febre do Vale do Rift pode prejudicar gravemente os fetos humanos se contraído pelas mães durante a gravidez, informa uma nova pesquisa.
Em um estudo publicado no mês passado pela revista Science Advances, pesquisadores usaram ratos infectados e tecido fetal humano para descobrir de que maneira o vírus ataca a placenta. Os resultados mostraram que o vírus pode ser até mais perigoso para os fetos do que o Zika vírus, que desencadeou uma crise global em 2015 e deixou milhares de crianças com graves malformações na América Central e do Sul.
"O Zika apanhou todo o mundo de surpresa", afirmou Amy Hartman, especialista em doenças infecciosas da Universidade de Pittsburgh, que dirigiu a pesquisa. "Se os médicos soubessem dos efeitos do Zika no nascimento, poderiam ter feito muito mais para proteger as mulheres grávidas e seus bebês. Com a febre do Vale do Rift, estamos tentando nos adiantar".
A febre do Vale do Rift se manifesta originalmente no gado na África Subsaariana, com surtos que causam de 90% a 100% dos abortos nas vacas grávidas do rebanho ou dão origem a natimortos. Mas centenas de casos ocorrem também anualmente nos seres humanos, causando sintomas semelhantes aos da gripe e graves problemas no fígado.
Os surtos espalharam-se para além da África: no final de 2000, um surto registrado na Arábia Saudita infectou mais de 100 mil pessoas e matou pelo menos 700, disse Amy Hartman. O mosquito que carrega a doença é encontrado também na Europa e nas Américas.
"A mudança climática pode alterar a maneira como as doenças infecciosas se alastram", explica a especialista. "Como as populações de mosquitos se deslocam e mudam, temos aí um potencial para que esta se espalhe muito além de suas fronteiras normais".
Não há vacinas ou tratamentos contra a febre. A Organização Mundial da Saúde declarou a doença uma emergência potencial da saúde.
Já foram documentados dois casos de fetos infectados. Um bebê nasceu com o fígado e o baço de tamanho muito grande, entre outros sintomas. Outro morreu em uma semana. Como a doença pode ser assintomática nas grávidas, muitos outros casos de anormalidades e de bebês natimortos talvez tenham sido mal interpretados.
Testes realizados no tecido da placenta humana revelaram que, ao contrário do vírus Zika, o da febre do Vale do Rift tem uma capacidade peculiar de infectar uma camada especializada de células que sustenta a região da placenta de onde fluem os nutrientes. Segundo Amy, o vírus da Zika precisa tomar "estradas secundárias" na placenta para infectar um feto, enquanto o da febre do Vale do Rift pode pegar a "via expressa".
"O feto é protegido contra centenas de milhares de perigos que poderiam afetá-lo. Apenas alguns micróbios podem passar, e este é um deles", salientou.
"Precisamos de mais pesquisas na área de epidemiologia, sobre como ele provoca a doença, e como impedi-lo. Ele poderá se espalhar muito além das áreas em que se encontra no Oriente Médio, de modo que os avanços são absolutamente imprescindíveis", disse Cynthia McMillen, pesquisadora em pós-doutorado do laboratório de Amy Hartman.